O milagre ao contrário
O homem não é o centro do mundo, ele é o fim do mundo
Paul Virilio
Ao longo dos anos de euforia, nomeadamente pela descoberta do Ciberespaço e a chegada da Nova Economia, pouco se ligou aos principais críticos do progresso, nomeadamente a Paul Virilio, um dos mais esclarecidos “reaccionários” europeus. As reflexões de Virilio incidem particularmente sobre o tema da velocidade – e “não se pode separar a velocidade da riqueza”, como ele nos diz – e na forma como a exponencial aceleração do mundo e a descoberta do limite psicológico e físico da velocidade da luz impactou as nossas vidas. Previa ele que “doravante não se acelerará mais (…) o choque violento contra a barreira do tempo é um acontecimento que nos vai fazer afrouxar, fazer regressar, voltar atrás”. Hoje, com o NASDAQ e todas as outras bolsas em alegre exercício de “bungee jumping”, tememos que tivesse razão.
Não sei se foi Virilio quem inventou a expressão “bolha financeira”, mas foi desta forma que ele se referiu à economia desfazada de um tempo histórico e do território. E tinha razão, claro. A forma especulativa da economia sobrepôs-se a tudo o resto e sincronizou-se mundialmente. Japão, EUA e Europa batem ao mesmo ritmo cardíaco: taquicardia pura.
Não há ganho sem perda
Segundo Virilio, cada nova invenção transporta em si duas ameaças: o que ela nos faz perder e o acidente que lhe é consequente. Por um lado, o elevador faz-nos perder as escadas, o avião faz-nos perder os paquetes transatlânticos e o TGV faz-nos perder a paisagem. Por outro, “inventar o navio é inventar o naufrágio, inventar o avião é inventar a explosão, inventar a electricidade é inventar a electrocução”. É o acidente que, define Virilio, “é um milagre ao contrário”. Não é possível negar que a euforia do progresso – programada não se sabe bem por quem (Sandy Stone dizia que estamos agarrados à cauda de um tigre invisível) e memeticamente propalada pelos media, pela economia e pela política – nos fechou as portas a uma atitude mais crítica em relação à tecnologia. Uma das razões da existência da Fronteira Electrónica é que as bases de dados, que permitem novas e promissoras formas de marketing, também ameaçam a privacidade; e o seu acidente pode bem ser a violação dos nossos direitos.
Porém, a questão do acidente, quando este ocorre sobre as redes mundiais de comunicação, toma proporções distintas às das antigas redes (viárias, ferroviárias, aéreas). Ainda Virilio: “O Titanic afundou-se num local, o comboio descarrilou num outro. Mas nós criámos através da interactividade, as redes e a mundialização que provoca a revolução nas transmissões, a possibilidade de um acidente, já não particular, mas geral. Prepara-se assim um acidente que ocorrerá por todo o lado e ao mesmo tempo!”
A luta ecológica dos anos sessenta alertou-nos, provavelmente pela primeira vez, para a necessidade de uma cidadania – ou uma ética política – planetária e já não estritamente local. Ecologia e guerra – não a “bolha financeira” – são, aliás, as principais potenciais ameaças de um grande acidente. Não partilhando a negatividade de Virilio (que ele mesmo atribuía ao facto de estar praticamente só no coro das vozes discordantes) acredito que temos, todos, de aprender uma atitude mais crítica em relação à tecnologia e ao progresso, perscrutando entre a montagem alucinante dos media, da economia e do discurso político, onde é que está o acidente e onde é que está o milagre.
Não sei se foi Virilio quem inventou a expressão “bolha financeira”, mas foi desta forma que ele se referiu à economia desfazada de um tempo histórico e do território. E tinha razão, claro. A forma especulativa da economia sobrepôs-se a tudo o resto e sincronizou-se mundialmente. Japão, EUA e Europa batem ao mesmo ritmo cardíaco: taquicardia pura.
Não há ganho sem perda
Segundo Virilio, cada nova invenção transporta em si duas ameaças: o que ela nos faz perder e o acidente que lhe é consequente. Por um lado, o elevador faz-nos perder as escadas, o avião faz-nos perder os paquetes transatlânticos e o TGV faz-nos perder a paisagem. Por outro, “inventar o navio é inventar o naufrágio, inventar o avião é inventar a explosão, inventar a electricidade é inventar a electrocução”. É o acidente que, define Virilio, “é um milagre ao contrário”. Não é possível negar que a euforia do progresso – programada não se sabe bem por quem (Sandy Stone dizia que estamos agarrados à cauda de um tigre invisível) e memeticamente propalada pelos media, pela economia e pela política – nos fechou as portas a uma atitude mais crítica em relação à tecnologia. Uma das razões da existência da Fronteira Electrónica é que as bases de dados, que permitem novas e promissoras formas de marketing, também ameaçam a privacidade; e o seu acidente pode bem ser a violação dos nossos direitos.
Porém, a questão do acidente, quando este ocorre sobre as redes mundiais de comunicação, toma proporções distintas às das antigas redes (viárias, ferroviárias, aéreas). Ainda Virilio: “O Titanic afundou-se num local, o comboio descarrilou num outro. Mas nós criámos através da interactividade, as redes e a mundialização que provoca a revolução nas transmissões, a possibilidade de um acidente, já não particular, mas geral. Prepara-se assim um acidente que ocorrerá por todo o lado e ao mesmo tempo!”
A luta ecológica dos anos sessenta alertou-nos, provavelmente pela primeira vez, para a necessidade de uma cidadania – ou uma ética política – planetária e já não estritamente local. Ecologia e guerra – não a “bolha financeira” – são, aliás, as principais potenciais ameaças de um grande acidente. Não partilhando a negatividade de Virilio (que ele mesmo atribuía ao facto de estar praticamente só no coro das vozes discordantes) acredito que temos, todos, de aprender uma atitude mais crítica em relação à tecnologia e ao progresso, perscrutando entre a montagem alucinante dos media, da economia e do discurso político, onde é que está o acidente e onde é que está o milagre.
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