"The successor to politics will be propaganda. Propaganda, not in the sense of a message or ideology, but as the impact of the whole technology of the times."
Marshal McLuhan

domingo

Bem-vindo ao Ciberespaço

Ao ritmo dos quanta, tudo é simultâneo e holístico. Por força da electricidade, a distância contrai-se a medidas de grandeza cujo processamento está além das nossas capacidades. Desterritorialização e destemporalização são consequências imediatas da velocidade a que circula a informação. Mas esta velocidade é também aquela a que se resolve a experiência. Daí que o novo tempo tenha destruído o espaço e criado envolvimento em profundidade, de caminho fritando-nos o cérebro. Deu nascimento a uma nova interioridade, um sistema nervoso cada vez mais próximo de, ou mesmo simultâneo com, as suas extensões. O homem explodiu e o universo implodiu. O paradigma que defina esse equilíbrio, ou o ponto onde se interseccionam esses dois movimentos contraditórios, está ainda por definir claramente. De certo modo, Chardin chamou-lhe a noosfera; Jung, o insconciente colectivo; Lévy, a inteligência colectiva. E há quem lhe chame, simplesmente… o Ciberespaço.
O Ciberespaço existe em todo o lado e ao mesmo tempo, mas essa é só a forma mais fácil de colocar a questão (o real também está em toda a parte embora não ao mesmo tempo). Deveríamos antes dizer: no Ciberespaço existimos em todo o lado e ao mesmo tempo. Existimos, apenas e também, em tempo real. O Ciberespaço não é um espectáculo – como a História – mas uma experiência. É a isso que chamamos – ou deviamos chamar – “interactividade”. Deriva também daí a desintegração do tempo: a incapacidade de uma construção linear, substituida pela simultaneidade. Nesse sentido, não só nos encontramos esvaziados de distância, de causalidade e de interpretação, mas mesmerizados pela experiência. Depois do transe de Narciso, o coma profundo: sem história, sem olhar, sem linguagem.
McLuhan falava da “simulação tecnológica da consciência” como um momento de ascese, o nanosegundo em que o Homem se reúne ao Ciberespaço -- “A mensagem não é constituída pelas palavras, mas pelos efeitos na pessoa. É a conversão”. A simulação, ao contrário da História, designa as condições para os acontecimentos, e não os acontecimentos em si. O tempo é: tempo real, agora, sem construção verbal de passado ou futuro. Não existe escatologia; o resultado está em aberto.
No livro “Joystick Nation”, J.C. Hertz diz que “os videojogos são o treino perfeito para a vida na América fin-de-siècle, onde a existência diária exige a habilidade de gerir dezasseis formas de informação que nos são disparadas pelos telefones, televisores, faxes, pagers, PDAs, sistemas de mensagens de voz, correio postal, correio electrónico e a Internet”.
E continua: “Os nascidos com o joystick possuiem vantagens incorporadas (…) os miúdos criados com videojogos não são deficitários de atenção, moralmente aberrantes, pequenos zombies iliteratos que massacram gente em massa após demasiado Mortal Kombat. Eles são, simplesmente, aclimatados a um mundo que cada vez mais se assemelha a uma experiência de arcada”.
O tempo Universal aproxima-se vertiginosamente do, sincroniza-se com, o tempo do Ciberespaço. Por ora, talvez isto não seja muito óbvio. Mas a progressiva aceleração da cultura, da economia, etc., levar-nos-á a um momento em que a vida será representada e interpretada no seu aspecto imperfectivo. Como uma “experiência de arcada”, tal como nos diz Hertz ou, para sermos mais precisos, como uma “simulação tecnológica da consciência”.
É o fim do mundo, mas apenas o fim do mundo tal como o conhecemos (tal como canta Michael Stipe). Porque outro, novo, caótico, orgânico-maquinal, digital e imensamente mais divertido está para nascer.